O Programa de Iniciação Científica (PIC) desenvolvido pelo Instituto de Ciência, Tecnologia e Inovação de Maricá (ICTIM) formou, recentemente, 48 estudantes do Passaporte Universitário e já está na sua segunda edição (agora, atende a 56 alunos do Passaporte Universitário e 14 professores orientadores). O perfil dos estudantes confirma a proposta inicial do projeto, que foi criado para permitir a moradores de baixa renda do município, acesso gratuito ao estudo universitário em instituições privadas. Alguns desses alunos são vitoriosos em provas que vão muito além do universo acadêmico.
É o caso de Pedro Guerra, de 27 anos, aluno do Passaporte Universitário, cursa Administração na Universidade de Vassouras, e tem uma história de vida comovente. Aos 18 anos, antes de receber o diagnóstico de epilepsia, Guerra teve uma crise convulsiva e sofreu um traumatismo craniano. Foram quatro meses internado, sendo um em coma, sete cirurgias no crânio e sequelas graves, como hemiparesia (paralisia cerebral de um lado do corpo), dificuldades na fala e locomoção, diplopia (visão dupla) e perda de memórias recentes.
Passados nove anos desde o acidente, Pedro Guerra conta que tanto o Passaporte Universitário quanto o PIC foram fundamentais em sua recuperação: “Me achava incapaz de fazer uma ação dessas, como entregar um artigo, porque sentia que não tinha a mesma qualidade de antes. Os dois programas me trouxeram mais segurança. Passei por tudo isso e, hoje, concluí uma pesquisa, tenho um artigo pronto. O PIC me ajudou muito nessa questão da perda de memória recente e hoje consigo armazenar as informações. Tudo isso me treinou bastante, inclusive para ser palestrante”, conta ele.
Acompanhando toda a luta do filho, a mãe Andréa Alexandre Guerra considera que o PIC foi um divisor de águas nessa trajetória, dando mais autonomia e segurança a Pedro. “O que a Prefeitura de Maricá fez pelo meu filho foi mais do que inclusão. Maricá não enxergou o Pedro dentro de um rótulo. Deram a ele dignidade, deram um caminho, um futuro. Todos do ICTIM trilharam esse mesmo caminho junto com ele, ao longo de toda a pesquisa. Quando você dá ensino, você abre um leque. O Pedro agora despertou até mesmo para ensinar, e isso foi a partir do PIC.”
Essa edição tem mais um caso de superação. Aos 64 anos, Elizeth Pires, conta que, quando jovem, teve dificuldade de conciliar trabalho e faculdade, o que a impediu de concluir o curso universitário aos 24 anos. Com a constituição da família, o sonho do diploma foi ficando para depois. Ela abriu mão da carreira de servidora pública do Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), se dedicou à criação de seus dois filhos e enfrentou desafios também na tentativa de empreender.
Elizeth enxergou na divulgação do Passaporte Universitário a oportunidade para a retomada de um sonho. Com o apoio do marido e dos filhos, se candidatou e foi aprovada. Hoje cursa o 6º período de Serviço Social na Universidade de Vassouras e acaba de se formar do Programa de Iniciação Científica do ICTIM. A aluna relata episódios de etarismo, quando colegas apresentaram resistência e falas preconceituosas devido à sua idade.
“Houve até certa infantilização no trato comigo e posturas que questionavam a minha capacidade de produção foram levantadas, tanto pela idade quanto por eu ser mulher, mas isso não me abalou. Me fez muito bem entrar na faculdade aos 62 anos. Você ser idoso não é menos, é mais! Tenho plena consciência disso! Estou em uma fase em que tenho o privilégio de ter mais disponibilidade para estudar”, cita ela antes de completar: “Em Maricá, tenho universidade gratuita, transporte gratuito, possibilidade de fazer pesquisa de iniciação científica. Por que não aproveitar?”.
Caso semelhante viveu Adriana Maciel de Oliveira, 40 anos, mãe de Ryan, de 10 anos. Formada em Administração há 15 anos, ela decidiu mudar completamente de vida quando passou a se dedicar totalmente à criação do seu filho. Foram sete anos totalmente dedicados à maternidade. Hoje, aluna do Passaporte Universitário, cursa o 6º ano de Medicina Veterinária na Universidade de Vassouras.
“Mesmo me sentindo realizada como mãe, ainda sentia falta do meu desenvolvimento profissional. Como não tenho ninguém para cuidar do meu filho, eu levo Ryan comigo. Então, ele assiste às minhas aulas, os professores já o conhecem, e a gente brinca que ele vai se formar junto com a turma porque ele vive o dia a dia do curso”, diz a estudante.
O presidente do ICTIM, Carlos Senna, diz que a história de Elizeth é um reflexo de muitas outras mulheres, em que a vida toma caminhos que as levam a focar no trabalho, na família, e protelarem seus estudos: “O diploma universitário, para muitas, é um sonho, que tiveram que abandonar e acham que nunca vão poder resgatá-lo. Acho que o PIC e o Passaporte Universitário têm resgatado sonhos e, sobretudo, possibilitado a realização deles”, falou Senna.